Se você já tentou dezenas de vezes ter uma planta e ela sempre morre, um novo olhar para a natureza talvez seja a salvação.

“É a quinta vez que tento ter _________ em casa.” Complete o espaço em branco com a planta de sua insistência (e corrija o número de vezes, se for o caso). Toda semana, recebo uma mensagem dessas. Uma moça da Tijuca reclamou que tentou ter lavandas “dezenas de vezes” e, como elas sempre morrem em poucos dias, acabou concluindo que… tinha o “dedo podre”. “Não levo jeito para plantas; toda orquídea que eu compro não dura nada em casa”, escreveu uma senhora de Fortaleza após sucessivas tentativas de cultivar Vanda em uma cobertura devassada pelo vento.

Acho curioso como todas essas frustrações têm origem num mesmo olhar para a natureza: o de que a planta deve se submeter à vontade humana. Porque, afinal, se somos pessoinhas incríveis e estamos aqui de braços abertos para o verde, acolhendo em nossas casas essas pobres criaturas que não cresceriam sem nosso afeto, dedicação e insumos, como que pode elas terem a desfaçatez de morrer? Plantas, essas ingratas, hunft…

Poucas vezes nos damos conta de que as verdinhas colonizaram este planeta muito antes de qualquer bicho com perninhas, milhões de anos antes de mamíferos aparecerem por estas bandas e outros milênios antes de um macaco qualquer perder o rabo e a paciência com uma samambaia. Então, não custa lembrar a nós, bípedes arrogantes que somos, que esses seres clorofilados não precisam da gente para viver. É chocante, eu concordo, mas é a mais pura verdade.

Quando a insistência enraíza no quintal

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Plantas conseguem produzir seu próprio alimento com ar, sol, água e uma dúzia de coisinhas especiais que elas buscam no solo. Se uma hecatombe exterminasse exclusivamente a raça humana, as plantas seguiriam crescendo e fazendo fotossíntese. Orquídeas continuariam a dar flores, mangueiras seguiriam frutificando no verão, e as lavandas morreriam quando devem morrer, depois de alguns anos verdejantes. Já nós… bem, nós simplesmente não duraríamos nem um dia se todas as plantas sumissem da face da Terra. Olha que tapa na cara da sociedade!

Ok, pode ser que a Vanda não vivesse mais que uns poucos dias sem ter alguém para lhe regar em Fortaleza — o que faz todo o sentido, já que essa orquídea é nativa das florestas úmidas da Tailândia, onde ela certamente cresce sem que ninguém a fique paparicando. Talvez o nosso repentino desaparecimento exterminasse também plantas mais frágeis: sem ninguém para garantir cuidados especiais, muitos híbridos retornariam ao projeto original e selvagem de onde vieram. Teríamos milhos, tomates e morangos mais resistentes a pragas e doenças se a Terra ficasse algumas décadas sem a gente. E eu me achando a dona da florestinha lá de casa, quanta ingenuidade…

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Por que resolvi falar de hecatombes e extermínios? Para você largar dessa insistência em uma única planta, pessoinha! Para que insistir no alecrim se ele se nega a crescer na sua casa? Tem 60 espécies de manjericão — sessenta! Uma vai funcionar por aí, tenho certeza. Se a hortelã não foi pra frente, garanta o chá da tarde cultivando camomila, verbena, capim-limão e outras espécies de folhas finas ou duras, que talvez não seja culpa da sua “mão”, sabe? Se a lavanda não deu certo, mais provável é que essa flor mediterrânea esteja morrendo de calor no verão úmido e abafado de 45°C que faz na Tijuca todo janeiro. Com tanta planta tropical com flor por aí, para que insistir justo na que não curte o clima da sua casa?

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Quando a gente deixa de impor nossa vontade, a natureza se revela em toda a sua generosidade, mostrando mil outras verdinhas para você. Pode ser que seu jardim já esteja até sussurrando alguma plantinha no seu ouvido. Pense antes de sair plantando: o que cresce que nem mato na sua casa? O que vai como chuchu na cerca, mesmo que você não cuide? Esse pode ser o caminho para você e seu cantinho verde fazerem as pazes e começarem de novo, mais fortes.

 

Texto escrito por Carol Costa e publicado na revista “Natureza” – 356.

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